Após uma disputa eleitoral em condições desiguais em termos de recursos, o professor da rede pública Nodecir Pereira, do PSD, conhecido como Professor Santinho, chega à prefeitura de Ninheira, cidade norte-mineira com pouco mais de 10 mil habitantes, com muitos sonhos na cabeça e os pés bem firmes no chão
Por Jerusia Arruda
Surpreendente. É assim que Nodecir Pereira, do PSD, conhecido como Professor Santinho, define o resultado das eleições a prefeito de Ninheira, município situado no Alto do Rio Pardo, Norte de Minas Gerais. Ele foi o único candidato da região a derrotar um adversário em campanha de reeleição – um feito raro nas últimas eleições em todo o país.
Professor da rede pública de ensino, nos últimos anos atuando como diretor da Escola Estadual Professor Marcionilo Pereira Dutra, zona rural de Ninheira, Santinho venceu as eleições municipais em 2024 já na primeira vez em que se candidatou a prefeito, após uma disputa em condições desiguais em termos de recursos, tendo como vice-prefeito Anderson Lopes Ferraz, do Solidariedade, na coligação formada pelos partidos Solidariedade, PP e PSD.
Com o lema “A esperança está em nossa gente”, ele chega ao comando do município com a cabeça cheia de sonhos e ideias inovadoras, mas com os pés bem firmes no chão, por saber o tamanho do desafio que tem à frente: elevar o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal do município, atualmente estimado em 0,604, um dos mais baixos do estado; ampliar o acesso a serviços essenciais e a políticas públicas estaduais e federais; e melhorar a qualidade de vida da população, estimada em pouco mais de 10 mil habitantes.
Em sua primeira visita a Montes Claros como prefeito de Ninheira, Santinho conversou com a reportagem da Revista Tempo quando falou sobre os desafios para vencer as eleições, as condições em que recebeu a prefeitura e as ideias e projetos para fazer sua gestão dar certo. Confira a seguir.
Jerusia Arruda: Prefeito, vamos iniciar traçando o seu perfil. Quem é o Professor Santinho?
Professor Santinho: Vamos lá! Meu nome é Nodecir Pereira, tenho 41 anos, filho de José Gonçalves da Costa Filho, conhecido como Seu Dezinho, baiano da cidade de Piripá, falecido há 14 anos, e de Anorita Pereira, Dona Norita, que é ninheirense. Minha mãe cresceu na Fazenda Mangueiro. Na época, as coisas eram muito difíceis e quando ela completou 7 anos de idade meus avós mandaram ela para morar com meus tios, Seu Manoel Honório e com Dona Tuta, irmã mais nova do meu pai, na mesma fazenda. Numa visita do meu pai à irmã, eles se conheceram, começaram a namorar e logo se casaram e se mudaram para São Paulo, onde viveram por cerca de seis anos. Quando eu nasci eles decidiram retornar para que pudessem me criar no interior. Foi na Fazenda Mangueiro que eu cresci e morei a vida inteira. Sou casado há 20 anos com Adarlete dos Santos Pereira e pai de Cibelly, 19 anos, e de Flávio, 12 anos. Sou graduado em Matemática e Física, pós-graduado em Educação Matemática, professor da rede pública estadual desde 2007, efetivo desde 2011. Nos últimos anos fui diretor da Escola Estadual Professor Marcionilo Pereira Dutra, na comunidade de Lagoa da Fazenda, zona rural de Ninheira – por isso fiquei conhecido como Professor Santinho. Também sou atleta amador, jogo futebol, e rodei o município praticando esse esporte que para mim é uma paixão, por aproximar as pessoas; conheço todo mundo e todo mundo me conhece em Ninheira.
Jerusia Arruda: De onde veio o seu interesse pela política?
Professor Santinho: Eu sempre gostei de política, sempre acompanhei. Um tio da minha esposa foi vereador, um amigo meu foi vereador, e sempre convivi muito de perto com eles, ajudando nos projetos. Na eleição anterior, em 2020, decidi eu mesmo me candidatar e fui o quarto vereador mais bem votado do município, mas tive a infelicidade de empatar com uma colega de partido, que só fez uma vaga, e como ela era mais velha, acabou se elegendo e eu fiquei de fora. Sofri uma perda política, porém tive uma vitória enorme porque aprendi muito naquela eleição. Foi a primeira vez que me candidatava, conhecendo o mundo político pelo lado de dentro, e nesses últimos quatro anos passei a me dedicar mais, como oposição, e nessa eleição surgiu a oportunidade de me candidatar a prefeito. Consegui êxito, graças a Deus.
Jerusia Arruda: Imagino que não deve ter sido uma disputa fácil.
Professor Santinho: Nada fácil. Em cidade pequena a gente vive tudo muito intensamente pelo fato de se conhecer pessoalmente todo mundo, então, acaba criando uma rivalidade excessiva. Apesar de meu adversário não ser da nossa cidade, ele é conhecido por lá desde 1997. A política por lá é muito apaixonada e às vezes o pessoal leva isso ao extremo. No começo da campanha, por exemplo, tivemos que acionar o Ministério Público para intervir. Em Ninheira, o grande movimento é no sábado, na feira. Cerca de 73% da população do município vivem na zona rural e no sábado grande parte vem para feira popular, e aí é um momento de encontrar as pessoas, saber o que acontece lá na comunidade. E em um sábado desses, ainda na pré-campanha, teve um confronto de apoiadores, tivemos que acionar o Ministério Público, e foi preciso fazer um revezamento para evitar novos conflitos. Como nossa campanha não era de confronto, decidimos falar com as pessoas diretamente nas comunidades rurais. Realmente foi uma campanha bem apertada, disputada, mas vencemos com 52,20% dos votos.
Jerusia Arruda: Foi uma surpresa?
Professor Santinho: De certa forma sim, porque o prefeito estava indo para a reeleição, então eram campanhas muito desiguais em termos de recursos. Eu fui o único candidato da região do Alto Rio Pardo a derrotar um adversário em campanha de reeleição – um feito raro nas últimas eleições, não só na região, mas em todo o país.
Jerusia Arruda: A que o senhor atribui esse resultado?
Professor Santinho: Poderia dizer que foi mérito nosso, se eu já fosse um político tradicional, já tivesse ocupado cargos públicos na gestão municipal, as pessoas me conhecessem como político e merecesse uma chance de voltar. Mas não, estou entrando pela primeira vez. Então, eu diria que também foi demérito da gestão anterior. Eu conheço bem a realidade do nosso município, caminhei a vida toda ao lado das pessoas, no seu cotidiano, sempre fui uma delas, igual a elas, professor dos filhos delas, e durante a campanha apresentamos nossas ideias, nossas propostas. Visitei todas as pessoas que não conhecia, me apresentei a elas, fiz questão de ir em todas as regiões e entrei em praticamente todas as casas na zona rural; na sede eu não consegui, faltou tempo. Nessas visitas ouvi as queixas, muita reclamação, de tudo. De falta de assistência à saúde, do básico ao complexo; da falta de atenção e cuidado com as pessoas. E nossa proposta é justamente essa: cuidar das pessoas. Então, eu acho que a população fez a escolha por um dos seus.
Jerusia Arruda: Como a gestão recebeu o resultado das eleições?
Professor Santinho: Não aceitaram bem a derrota, dificultaram nossa chegada, foi preciso acionar o Ministério Público para fazer a transição, que só foi iniciada em meados de dezembro, mesmo assim alguns servidores tiveram de contrariar a ordem de não repassar nenhuma informação. Então, só conseguimos ter acesso à situação do município depois da posse. É meu primeiro mandato e é tudo muito novo, e não ter a transição da forma que deveria acabou dificultando um pouco esse início.
Jerusia Arruda: E o que vocês encontraram?
Professor Santinho: Encontramos uma frota de carros e maquinários danificada e sem condição de uso; carros novos, adquiridos em 2022, em situação precária; o centro de saúde sem medicamentos e insumos; as escolas sem condições de receber os alunos, todas precisam de reformas, inclusive no final do ano a inspetora da Superintendência Estadual de Ensino de Araçuaí fez uma visita e no relatório deixou isso muito claro; ônibus do transporte escolar sucateados; tem uma dívida com o SAMU de mais de R$ 34 mil, valor alto para o município; tem dívida de empenhos; toda mão de obra do município era terceirizada e tem funcionários reclamando que não receberam salários; direitos trabalhistas que não foram pagos; e a maior preocupação inicial, que é o INSS de novembro que não foi pago e o prazo é curto para tomar uma providência ou negociar com a Previdência, sob o risco de comprometer o repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), principal fonte de renda de cidades pequenas como a nossa. Administrar um município não é fácil, mas nessas condições se torna um desafio enorme. E a gente fica sem uma resposta imediata para a população, justamente porque ainda estamos tomamos pé de toda a situação. Realmente, faltou fazer a transição.
Jerusia Arruda: O que a população de Ninheira pode esperar da nova gestão?
Professor Santinho: Nosso foco é cuidar das pessoas. Eu sempre falava nas reuniões de campanha sobre a diferença de ter uma casa e ter um lar, que representa exatamente esse cuidado integral com as pessoas. Pelos relatos que ouvi percebi que a população quer ser cuidada, quer mais atenção, chegar ao PSF e receber um atendimento humanizado. Muitos reclamaram para mim durante a campanha que iam à secretária de Saúde com um problema e voltava com dois, pois não resolvia o problema inicial e ainda voltava estressado, chateado pela forma como foi tratado. Ao ouvir isso, construímos um plano de governo firmado nesse cuidado. Nossa meta é capacitar as pessoas que trabalham na prefeitura para oferecer o melhor atendimento, na saúde, na educação, no transporte, no setor de obras, em todas as áreas. É claro que a mudança não acontece da noite para o dia, é um processo gradativo e constante. Queremos superar as dificuldades e trazer inovações para elevar o município a um novo nível.
Jerusia Arruda: O novo secretariado está preparado para colocar esse plano em prática?
Professor Santinho: Nós trabalhamos muito na campanha com a proposta de fazer uma gestão diferente, mas reforço que é uma construção, e pedimos à população um pouco de paciência, porque não dá para fazer tudo de uma vez. Estamos com uma equipe nova, o secretariado é uma mescla de pessoas com experiência e de novos gestores, mas todos com muita disposição em fazer o seu melhor para mudar a realidade do nosso município, principalmente para os que mais precisam do poder público. Pessoalmente, vou continuar a minha rotina de conviver no dia a dia com as pessoas, conversando, ouvindo suas demandas, suas reclamações, tentando sempre levar uma resposta. Somos gratos pela oportunidade e estamos animados e confiantes em fazer dar certo, se Deus quiser.
